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KLF: Magia do Caos, Música e Dinheiro

Atualizado: 20 de mar. de 2022


KLF

Em “Illuminatus! Trilogy” são feitas incontáveis referências ao Principia Discordia, incluindo até mesmo uma descrição minuciosa do rito iniciático dos Discordianos. Os autores do Principia, Kerry Thornley e Greg Hill, foram colegas no ensino médio e já começaram a ter ideias para o livro nessa época. Eis um trecho do livro a esse respeito:

“Foi numa pista de boliche em 1957 que Thornley mostrou para Hill alguma poesia que ele estava escrevendo. Ela incluía uma referência de ordem eventualmente surgindo a partir do caos. Hill riu disso. Ele disse para Thornley que a ideia de “ordem” era uma ilusão. Ordem é apenas algo que a mente humana projeta na realidade. O que realmente existe por trás dessa falsa aparência é um caos infinito, revolto. Para Hill, um ateísta, o fracasso em entender isso era a maior tolice das religiões organizadas do mundo, todas as quais clamam que há um princípio organizado atuando no universo “


“Hill também contou para Thornley que os gregos antigos eram uma exceção a essa regra, pois eles tinham uma Deusa do Caos. O nome dela era Éris, que significa “desentendimento” e que é traduzido para ‘Discórdia’ em latim. Claramente, se alguém quisesse adorar uma deidade que fosse genuinamente ativa nesse mundo, então Éris seria a opção digna de confiança. Tudo o que era preciso era que alguém criasse uma religião em torno Dela a qual, naturalmente, eles decidiram criar. Eles a chamaram Discordianismo”.


Sobre as contradições inerentes ao Discordianismo (que também são naturais em quaisquer sistemas de crenças), seus autores encaravam com bom humor. Uma das inovações apresentadas foi o conceito de “catmas” que só eram diferentes dos “dogmas” por serem verdades inquestionáveis e absolutas que mudam de tempos em tempos. Essa noção é muito parecida com a que Peter Carroll aponta em Epoch: esse livro apresenta um novo paradigma, mas é válido somente enquanto não surge um melhor para substituí-lo.


Essa frase me lembra o seguinte trecho do livro “The Book of Baphomet”, de Nikki Wyrd e Julian Vayne:

“Minha primeira lição de química na universidade, um ano preparatório, em nossa introdução à ciência foi explicado como a ciência nos fornece apenas um modelo da realidade. ‘Átomos’ não são reais de uma forma objetiva; não existem pequenas esferas circulando ao redor no centro de tudo. É apenas uma história. A ciência nos fornece ideias, hipóteses, com as quais nós tomamos posse da matéria e a manipulamos. Se a ideia funciona nós a mantemos, enquanto almejamos por uma melhor. Um princípio básico do pensamento criativo afirma que você deve continuar procurando por outra solução melhor, mesmo depois de achar uma”

Interessante lembrar que a banda KLF resolveu fazer uma exibição do vídeo que gravaram queimando um milhão de libras na casa de um famoso magista: Alan Moore.


A abordagem de Moore para a magia envolveria a imaginação, conforme demonstra o seguinte trecho do livro:

“Quando coisas biológicas no mundo físico evoluem para um certo nível de complexidade, eles se tornam vivos, conscientes, indivíduos autodeterminados. Será que o mesmo poderia ser verdade para ideias do mundo não físico? Será que ideias suficientemente complexas evoluem numa forma de vida e passeiam no Espaço das Ideias como bem entendem? Se esse fosse o caso, explicaria todas as histórias de fantasmas, alienígenas, fadas, anjos, elfos, espíritos de coelhos gigantes invisíveis, a Deusa Éris e todas as outras criaturas irreais que aparecem ao longo das culturas e histórias”


E como seria possível expressar essas ideias? Por meio de símbolos. No entanto, os símbolos seriam somente o mapa e não a coisa em si. Como é costume dizer, muitos confundem o mapa com o território. A cabala, por exemplo, mostra um diagrama simplificado da realidade. Ela não é a realidade em si, mas somente as coisas como aparentam ser. Nós não sabemos como as coisas são, pois a mente humana somente é capaz de captar uma sombra do mundo e expressá-la por meio de modelos. Por exemplo: existe o modelo psicológico da magia, que explica que entidades (demônios, elementais, etc) existem apenas na mente, ou são uma projeção mental. Existe o modelo dos espíritos, que interpreta que as entidades possuem existência separada da nossa mente. Há muitos outros modelos. Nenhum está mais certo ou errado que outro. Cada interpretação está certa dentro de seu respectivo paradigma. O magista deve escolher a interpretação com a qual se identifica mais ou se sente mais à vontade. Ou pode fazer como os caoístas, que utilizam variados modelos para uma maior flexibilidade mágica (e diversão!) e para sempre recordar que todas essas explicações não são a verdade, mas apenas modelos.


Há o seguinte trecho a esse respeito no livro “Postmodern Magic” de Patrick Dunn:

“Para ser um mago bem sucedido você deve entender que os símbolos constroem os fundamentos da realidade”


E outro trecho do livro “Magic, Power, Language, Symbol” do mesmo autor:

“Uma vez que eu já argumentei que o mundo real é, em última instância, simbólico, é um pequeno passo argumentar que alterar os nossos códigos sobre a realidade altera a realidade”

“O magista não vive num mundo de causa e efeito rígidos. Pelo menos, ele ou ela admite a possibilidade de causas não materiais e efeitos imprevisíveis”

Aí entra a Teoria do Caos. A respeito do Caos surgindo tanto na matemática como na magia nos anos 70, é dito por Higgs:


“No que foi pensado ter ordem, as pessoas acharam caos; contudo, quando eles então olharam para o caos eles acharam ordem”

Mais adiante, o autor relata o contexto histórico do surgimento do dadaísmo e como ele simbolizava uma forma de “Dark Tao” derivado do taoísmo. E foi em meio a essas ideias que Bill Drummond e Jimmy Cauty criaram a “Fundação K” atuando não mais como uma banda, mas como artistas.


Em resposta a uma crítica literária que dizia “Sim, regras devem ser violadas, mas para violá-las você deve primeiro conhecê-las”, um grupo dadaísta de Paris disse o seguinte (achei esse trecho no livro “The Third Mind” de William Burroughs e Brion Gysin):

“Sim, você deve conhecer regras, mas para conhecê-las você deve primeiro violá-las”

“Sim, você deve dominar conhecimento, mas para dominá-lo você deve primeiro violá-lo”

“Sim, você deve dominar violações, mas para dominá-las você deve primeiro conhecê-las”. 

“Sim, você deve conhecer violações, mas para conhecê-las você deve primeiro dominá-las”

“Sim, você deve violar conhecimento, mas para violá-lo você deve primeiro dominá-lo”


De acordo com a teoria da relatividade geral de Einstein, a velocidade da luz deve ter um limite, porque a massa de uma partícula aumenta conforme ocorre o aumento da velocidade. Sendo assim, a massa de um corpo não poderia aumentar indefinidamente. Aplicando esse conceito na economia, uma vez que existe uma quantidade limitada de recursos (e de dinheiro), o dinheiro não poderia circular e aumentar indefinidamente. Em algum momento deve haver um limite, ou resulta em colapso.


Mas como destruir esse ciclo? Drummond e Cauty manteriam o dinheiro em circulação se simplesmente o gastassem em qualquer coisa. Portanto, a solução logo começou a se mostrar.


Robert Anton Wilson fez questão de espalhar teorias da conspiração sobre os Illuminati não somente em seus livros, mas também na série de cartas conspiratórias que postou na Playboy, na época em que trabalhou como editor das cartas da revista.


E os Discordianos também ajudaram, até que cartas anônimas com conspirações começaram a surgir na Playboy vindas dos próprios leitores. RAW também fez questão de mencionar as associações em torno do número “23”. Mas será que existiam mesmo todas essas ligações? Conspirações, números se encaixando com letras e muitos outros simbolismos estudados na magia tradicional? Ou será que a realidade é muito mais caótica do que parece e nossa mente constroi as associações?


Sobre isso, Patrick Dunn escreve:

“Quando nós percebemos um padrão, nós o criamos – nós colocamos o mundo em ordem e fazemos um universo que vem do caos. O que é, em última análise, a ideia central da gematria”

“Aleatoriedade não tem significado, mas quando nós descobrimos significado em meio ao aleatório, nós criamos ordem e destruímos a entropia”


Em última instância, enxergar o universo como ordem ou como caos são apenas modelos da realidade. Pois a realidade tal como é possivelmente não seria nem ordem e nem caos, mas algo que não pode ser traduzido em termos de lógica ou de sensações do cérebro humano. Afirmar que as sephiroth da Árvore da Vida possuem relação com planetas, números, etc, não é uma mentira, pois isso é verdadeiro dentro do paradigma de interpretação da realidade da magia tradicional. Por sua vez, enxergar a realidade como caótica (a mente constrói as associações e cria significados, pois elas não possuiriam existência objetiva) é semelhante a usar o modelo dos espíritos e o modelo psicológico: somente questão de preferência.


Afinal, por que Bill Drummond e Jimmy Cauty queimaram um milhão de libras? Eu recomendo a leitura do livro “KLF: Chaos Magic Music Money” para que você descubra respostas muito inteligentes e elegantes para esse e muitos dos outros questionamentos apresentados nessa postagem. Esse livro é um clássico de Magia do Caos e certamente um dos melhores que li sobre o assunto até hoje.

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